A ESTRELA SOBE. VITOR ANTUNES E BRUNO BARRETO.




 Mofistas em Manchete: 



De uma conversa ligeira entre amigos surgiu a ideia de falar sobre “A Estrela Sobe”, filme de 1974, dirigido por Bruno Barreto, porém fora de catálogo desde a Década de 80. “Eu tenho uma cópia, Tião”. O filme, avis-rara, ganharia então, uma resenha.  Afinal, além de seu sumiço, várias lendas cercavam-no. Uma delas, a de que houve uma cisão entre os produtores que acabou contribuindo para o desaparecimento da película. Dias após fechada a data de entrega do texto, este autor recebeu, por engano, o telefone de Cacá Diegues, um dos colaboradores do roteiro. O próprio Cacá indicou que os articulistas que assinam esta matéria procurassem pelo diretor, Bruno Barreto. Assim, o que era para ser uma resenha acabou virando uma reportagem em duas partes. Aqui, a última parte da série de textos sobre “A Estrela Sobe”, que começou com um panorama sobre Betty Faria em 1974 e se encerra hoje, com os bastidores do filme campeão de bilheteria daquele ano.  


Os Suspiros de Lucíola


Um jovem com menos de vinte anos, e com mais sonhos que idade. Esse era Bruno Barreto. Cineasta filho dos produtores/cineastas Lucy e Luiz Carlos Barreto. Bruno já vinha de uma carreira como fotógrafo d’O Pasquim, e com alguns curta metragens, quando finalmente, aos 17 anos, consegue montar o seu primeiro longa: “Tati, a Garota”. No elenco, ao menos quatro nomes já eram grandes àquela época: Dina Sfat, já figura tarimbada no teatro, no cinema e na TV; Hugo Carvana, que já havia feito filmes como “Terra em Transe” e “Quando o Carnval Chegar”; Zezé Macedo, grande nome da chanchada; Além de uma jovem ainda tida como Revelação por haver vencido um Molière por seu trabalho como atriz e que fazia o seu primeiro filme: Yara Amaral. 


Bruno Barreto aos 11 anos.




Fotos de "Tati, a Garota"

O filme do então debutante faz muito sucesso, tanto de crítica como de público. Bruno, já aclamado por conta da produção de seu projeto, recebe uma valiosa recomendação da Produtora de Arte de “Tati”, Tereza Nicolau. A moça indicou-lhe a leitura do livro “A Estrela Sobe”, pois havia ali um bom plot para um filme. Bruno leu e interessou-se em montá-lo. Propôs, primeiro, a seu pai, LC Barreto, que declinou do convite: 



    - Meu pai não achava que fazer um filme de época fosse boa ideia. Ele achava que não teria bilheteria, não acreditava no projeto – Diz o diretor. 

  Bruno então procurou por outros produtores, como o Roberto Farias, que também não apostou na montagem. Por fim, LC Barreto ao montar uma sociedade com Walter Clark, então diretor da TV Globo, ambos os sócios perceberam que era necessário um filme para lançar a ICB – Indústria Cinematográfica Brasileira (Que viria a ser o embrião da atual Globo Filmes):


Walter Clark


    - O Walter Clark perguntou ao meu pai se havia algum projeto que eles pudessem montar, daí ele falou do meu, embora ainda repassando a ele todas as recomendações que ele me havia feito, de que era um filme de época e que talvez não desse bilheteria. O Walter leu o roteiro e gostou muito. Assim deu-se por iniciada a montagem de “A Estrela Sobe”. – Afirma Bruno.

 Aliás, há uma história que acerca o filme e que envolve tanto a família de Barreto como a de Clark: A de que houve uma ruptura entre as famílias, o que é negado por Bruno, que afirma, aliás, que Clark foi de fundamental importância para o projeto. Porém, quando a ICB foi dissolvida, tanto “A Estrela Sobe” como “Amor Bandido” ficaram com Walter, que viria a falecer em 1997. Daí a razão de “Estrela” nunca haver sido relançado senão por uma série em VHS ainda nos Anos 80.






Por ser fã do autor e amigo da família, Cacá Diegues colaborou no roteiro, que também teve a colaboração de Isabel Câmara, embora escrito por Leopoldo Serran. A negociação para a feitura do filme teve participação da própria avó de Bruno, que era amiga de Marques Rabello e ela o levou para conhece-lo. Talvez por esta aproximação familiar Rabello tenha optado por passar os diretos da montagem do filme à família Barreto, pois, segundo os jornais da época o cineasta Rodolfo Nanni também estava pensando em adaptá-lo para a telona. 


Lucíola Villela, avó de Bruno Barreto.

Marques Rebello




Além desta participação, Lucíola teve fundamental importância na produção do filme, não só por haver intermediado a produção dele, mas por haver importado uma moviola alemã, onde foi editado o filme. Para além das questões técnicas, Lucíola cumpriu a cota afetiva dos bastidores:

  - Minha avó sabia que eu gostava de suspiros, e então fazia-os e levava para mim no set, além dos lanches. – Diz Bruno.

 A produção do filme tinha, sobretudo, o valor do afeto. Era a extensão da família Barreto. Por conta disso criou-se a lenda, inclusive, de que a própria Lucíola fazia os figurinos do filme, o que é negado por Bruno:  “Há um folclore nisso. (Esta função cabia ao) Anísio Medeiros – que era diretor de arte e figurinista.” – Explica.

 A produção do filme acabou sofrendo influências da TV sob vários aspectos. Primeiro na escalação, pois que Dina Sfat, o primeiro nome proposto para viver Leniza Mayer, não pôde aceitar o papel, já que estaria na novela “Os Ossos do Barão”. Depois, Sandra Bréa. Embora na entrevista ao TV História Bruno saliente não lembrar as razões que impediram que La Brea pudesse fazer o filme, a atriz esteve escalada para outros dois filmes, além de estar escalada para Corrida do Ouro, fato que pode haver influenciado no fato de a atriz não haver topado de estrelar o filme, função que acabou sendo cumprida por Betty Faria. Depois de escalada e havendo gravado a sua participação no filme, a atriz teve de ser dublada por Norma Blum:

 “Naquela época a Tv estava deixando de ser em P&B e passando a ser em cores e que teria que ser gravada direto. Betty foi escalada para estar em “O Espigão”, porém o processo de dublagem do filme duraria pelo menos um mês” – Explica o diretor, justificando a gravação da voz de Norma Blum em vez da atriz protagonista.

Embora a cena da perda da virgindade de Leniza tenha sido censurada, o filme foi exibido integralmente nos festivais, embora, nos cinemas brasileiros, tenha sido exibido com cortes, justamente na cena supracitada. 


Bruno Barreto dirigindo "A Estrela Sobe".


 O filme foi lançado, segundo Barreto, de forma “hollywoodiana”, no Cinema Roxy, de Copacabana. Contou, inclusive, a com a presença de astros do rádio, que, segundo os jornais da época apontam, “não foram reconhecidos por boa parte dos espectadores”. “Estrela” foi um grande sucesso, tanto de critica como de bilheteria. 

 Quarenta e seis anos depois de gravado, o cineasta tira um saldo positivo da película:  “Claro que o tom talvez tenha ficado datado. Preciso revê-lo para ter uma opinião mais assertiva. Meus filmes são sobre a condição humana, não sobre uma causa específica. E por isso, e com suas devidas proporções, são histórias timeless, ou seja, não datadas, atemporais. (A Estrela Sobe) Foi uma experiência feliz, gostosa. Eu gosto muito de musicais e consegui fazer neste filme alguns números musicais. O trabalho do Francis Hime é uma coisa linda. A Betty nasceu para fazer aquele personagem. É a cara dela. É um deslumbre. Sempre me lembro de uma propaganda da época que dizia: ‘Betty Faria é Leniza Mayer em: “A Estrela Sobe’. Filme brasileiro de padrão internacional.’”

Bruno Barreto, Betty Faria entre Nicette Bruno, Paulo Goulart e Milton Gonçalves.



 Sem dúvida, “Estrela” é filme de ver com os olhos: O sorriso de Betty Faria ocupa toda a tela de uma sala de cinema que a idade não me permitiu ver. É algo tão doce quanto os suspiros de Lucíola. Mais uma das mais belas flores raras cultivadas no jardim do talento de Bruno Barreto.




Para ler o texto sobre o filme "A Estrela Sobe" estrelado por Betty Faria, clique aqui.

Vitor Antunes é ator e dramaturgo Em 2020 recebeu Menção Honrosa na Categoria Crônica na Academia de Letras e Artes de Araguari - MG, além de haver sido premiado em 2º Lugar no Prêmio Literário Felippe D'Oliveira. Foi finalista, em 2019, do Prêmio Cesgranrio de Literatura e, em 2017, do Prêmio CEPE de Pernambuco, na Categoria Infanto Juvenil. Em 2019, recebeu menção honrosa no 17º Prêmio Literário Paulo Setúbal em Tatuí - SP. Em 2018 foi agreciado com o 2º Lugar no Prêmio Celso Sperança em Cascavel - PR. Concorreu, também, a outro prêmios internacionais, na Espanha, China, Portugal, República Tcheca. Mas é, sobretudo, um arqueólogo de Televisão.
   
Twitter: @realvitorant
E-mail: (vitorantunes@globo.com)

Fontes de pesquisa:

Imagens:
Google Imagens 
Acervo O Globo
bases.cinemateca.gov.br
enciclopedia.itaucultural.org.br
www.bn.gov.br

Videos:
youtube.com




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