A NOVELA DA CENSURA DE DESPEDIDA DE CASADO (1976) - Parte 1

#Mofista7: Despedida de Casado, quando um raio cai duas vezes no mesmo lugar.


Stela e Rafael, Regina Duarte e Antonio Fagundes em cena de Despedida de Casado. Eles já estavam em crise, muitos anos antes de Por Amor.

"A CENSURA sempre existiu e existirá em toda sociedade organizada. Não existe país sem CENSURA. Nossa legislação de CENSURA é liberal se comparada a de outros países."

Rogério Nunes, Diretor da Divisão de Censura e Diversões Publicas da Policia Federal.

Boa noite amigos mofistas.

Estamos próximos de mais uma eleição e o que estamos vendo por aí é muitos reclamando de uma certa CENSURA, principalmente daqueles que emitem sua opinião em canais do Youtube. O motivo de tanto rebuliço está no fato de alegar estarem sofrendo retaliações por não poder expressar suas opiniões, mesmo que alguns concordem e outros não, eles defendem sua liberdade de expressão, de poder falar o que querem atraindo mais seguidores e detratores.

Tudo isso veio de encontro a um assunto que sempre despertou um fascínio em mim. A Censura do Regime Militar do Brasil da década de 60 e que esteve atuante no nosso País até o final da década de 80.

São clássicas as histórias de artistas que tiveram suas obras censuradas como Caetano Veloso, Raul Seixas, Chico Buarque, dramaturgos como Dias Gomes, Gianfrancesco Guarnieri, Braulio Pedroso, Jorge Andrade e filmes, peças de teatro, livros e novelas. Sim nossa teledramaturgia não escapou da sombra negra do Regime que pairava as telenovelas, principalmente da TV Globo,que era muito visada pela Governo daqueles anos 70.

Todos já conhecem ou já ouviram a história da proibição integral de Roque Santeiro (1975), caso não sabem deixo aqui o link do site Teledramaturgia que conta toda a história por trás da história de Dias Gomes,que foi gravada dez anos depois (1985) aproveitando os ares da Nova República.





Duas vezes Roque Santeiro: Em cima frames da abertura e Porcina e Sinhozinho Malta na versão de 75, abaixo o logotipo da versão de 85 e Porcina e Malta desta nova versão.


Porem diz o ditado: " O raio nunca cai duas vezes no mesmo lugar", mas o inesperado aconteceu e a Rede Globo se viu novamente num buraco negro com a proibição em todo território nacional de Despedida de Casado a novela que entraria no lugar de Saramandaia em janeiro de 1977. Hoje eu trago aqui algumas informações adicionais, de acordo com pesquisas de revistas e jornais da época sobre a proibição da novela de Walter George Durst há apenas dez dias de sua estreia e mostra como foi a dor de cabeça e a solução para cobrir o prejuízo causado por essa decisão.

PS: Como imaginado minha pesquisa cresceu ao longo dos dias e como não quero cansar você leitor vou dividir esse trabalho em DUAS PARTES.

A NOVELA DA CENSURA

Ninguém imagina, mas para uma novela ser exibida naquele período, pode - se dizer que era um ato de heroísmo por parte dos autores, produtores, elenco e principalmente da emissora faziam para que os censores dessem sinal verde para iniciar mais uma produção.

Tudo começava com a sinopse sendo enviada para Brasília. Lá uma equipe lia o texto que dava uma noção de como viria ser a história e um perfil dos seus personagens. Após essa leitura eles apontavam o que deveria ser mudado ou excluído do texto, isso podia ocorrer com a novela indo ao ar como aconteceu em vários casos,os mais célebres foram nas novelas Selva de Pedra de 1972 e Fogo Sobre Terra de 1974, ambas de Janete Clair. Comportamentos inadequados dos personagens e ambientação da história eram os principais alvos.

Com base nessa sinopse os censores é que decidiam em qual horário a novela iria ao ar. Uma vez aprovada começava as gravações, depois as fitas com elas eram enviadas novamente aos censores que analisariam e posteriormente apontariam cenas, diálogos que deviam ser mudados. Às vezes cenas inteiras podiam ser excluídas, até determinados personagens poderiam ser retirados, caso não fosse de agrado aos representantes da Divisão de Censura.

Caso eles achassem que a temática da novela era muito "pesada" eles detinham o poder de mudá-la de horário e em casos mais graves, como a não obediência das ordens estabelecidas por eles e não cumpridas pelos autores, diretores, produtores os censores simplesmente proibiam sua exibição ou em situação menos agressiva ordenavam seu encurtamento.


Acima o selo indicando o anuncio da exibição da novela Gabriela 1975 e abaixo o parecer dos censores referente ao filme O Enterro da Cafetina de 1977



O pesadelo da proibição de uma novela ir ao ar. A TV Globo enfrentaria isso novamente no final de 1976 com Despedida de Casado, novela escrita por Walter George Durst que estrearia em Janeiro de 1977, mais precisamente no dia 3 daquele mês.

A novela conforme era divulgada nas chamadas de estreia marcaria a volta de Regina Duarte na telinha. A atriz estava afastada das produções da casa desde o final de Fogo Sobre Terra. Regina alegou em entrevistas da época que estava incomodada com a imagem de “namoradinha do Brasil” e que isso de certa forma dificultava que ela ganhasse papéis mais fortes, em que nada lembrasse a figura virgem e cândida dos seus papeis nas ultimas novelas.




Regina Duarte como prostituta. O que tava acontecendo com a Namoradinha do Brasil?


Essa mudança ocorreu mais precisamente em 1975, após os fim de Fogo, Regina subiu aos palcos para interpretar “Janete”uma prostituta na peça Réveillon do autor mineiro Flávio Márcio. Numa declaração à revista Fatos & Fotos ela disse:

“O fato de terem me transformado numa eterna doce namorada estava me incomodando bastante. Daí ter partido para algo inteiramente diferente do que fazia na tevê. Esta peça (...) era a oportunidade que eu esperava. É um pouco de mim, reflete um momento meu, poe em cena problemas que há muito eu gostaria de discutir comigo mesma e de colocar para o público.”

Porém não passava pela cabeça da atriz que essa nova incursão na TV, estreando no horário das dez da noite seria vetada, aliás ninguém esperava que um raio iria cair duas vezes no mesmo lugar.
A bem da verdade a proibição de Despedida de Casado foi uma novela que a Globo nunca sonhou em produzir, um enredo de tão mirabolante que lendo as várias reportagens da época dava para se ter a ideia do quão foi complicado emplacar esse que seria “Mais Um Campeão de Audiência” fala comum durante as chamadas de interprogramas da emissora narradas pelo Dirceu Rabello.

Bem antes da proibição completa da novela que teve o título provisório de O Casamento, a Globo como era de praxe naquele tempos de ditadura enviou a Brasília três sinopses para que fossem avaliadas e caso fossem liberadas entraria na fase de pré produção. Durst além da sinopse de Despedida de Casado enviou uma sinopse baseada na obra de Nelson Rodrigues,  A Vida Como Ela É, e uma outra adaptação da obra de Jorge Amado, Dona Flor e Seus Dois Maridosescritor baiano o qual ele havia adaptado com sucesso o romance Gabriela, Cravo e Canela em 1975 pro mesmo horário das dez da noite em comemoração aos 10 anos de liderança da Rede Globo tendo Sônia Braga no papel título e grande elenco entre eles Armando Bogus, Dina Sfat, José Wilker, Nívea Maria, Paulo Gracindo entre outros. Resultado, todas as duas não foram aprovadas.








Na época , a Divisão de Censuras de Diversões Publicas (DCDP) do governo considerou que a narrativa seria prejudicial a moral e aos bons costumes, isso porque tocava em assuntos polêmicos envolvendo problemas relacionados ao casamento e aos valores familiares.  A emissora emitiu uma nota no seu boletim de programação e endereçada aos jornais e revistas comentando a proibição da novela.

“ A exibição da novela “Despedida de Casado”, já com trinta capítulos gravados, foi vetada pela Censura. A Globo colocará no ar a novela “O Bem Amado” até que se prepare um texto e produção para o horário de 22horas.”

Além disso o boletim mostrava o selo de apresentação da novela censurada com a legenda: “Estreia 4 de janeiro, 10 da noite. A cores”. Mais a distribuição das cenas gravadas  e um resumo já conhecido da história que os telespectadores iriam ver e só.




Frames da chamada original de Despedida. As chamadas eram P&B, mas a novela seria " A Cores".


Continua no próximo post.



Fontes de pesquisa:

Sites

www.teledramaturgia.com.br
www.acervoveja.com.br
www.acervofolha.com.br
www.oglobo.com.br
revistaamigaenovelas.blogspot.com.br

Imagens

www.youtube.com
revistaamigaenovelas.blogspot.com
www.acervoveja.com.br
www.acervofolha.com.br




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